segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Avulsos, como eu, como voce. ( cronica revisada)

Confusão de mim e ela, de ela e ela, de ela e ele. O que? O que disse ? Fala baixo, os outros podem ouvir, e isso não seria bom, nada bom.
Vivemos de silencio, eu e voce. Juntos. Ou não, talvez juntos, só para não estarmos sozinhos. É ruim estar sozinho, o que significa ? Sozinho: absolutamente só, sem par ou outro do mesmo gênero: único, sem apoio ou companhia, adjetivo só.
Não acho que seja apropriada essa definição. Parece fria demais, irreal demais, até para nós. Eu e você se preferir, porque isso aqui já deixou de ser nós. Não somos tristes, só solitários. Pelo menos temos um ao outro, isso é salvação. Minha e sua, nossa alma. Se é que isso existe. Uma vez você me falou de almas, mas eu não acreditei, porque você bebia enquanto dizia. E cheirava a tabaco.
Você gostava de cantar, me lembro bem... Desafinava em notas graves, e depois ria. Risada abafada, estranha, incomum. Feliz são os tolos, você não era feliz. Era completamente esclarecido. Depois de muitos anos, percebi que não se pode ter as duas coisas. E isso, são só escolhas.
Mulher ma, sabia exatamente o que fazia, sabia fumar. E como fumava... Linda sempre.Encantadora, com o pescoço fino e comprido, com os olhos de água suja. Com os dedos pequeninos, com as pantufas mofadas.
Não acredito, que poderia ter sido melhor. Um amor não pode pertencer a duas pessoas, e tenho o meu amor, como toda a gente. Como "agente".E esse amor ainda não usei.
 Como seria bom dizer que sim, dizer que sei, dizer que não consegui. Porém quis viver como se o amor existisse por si só. Erro, infantilidade. Você riria, caçoaria até na minha fraqueza, mulher indescritívelmente má. Mas senti, e só. Sem trair, sem definir, sem magoar.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Morena que cor é essa? ( tema : olhar para fora- cronica revisada )

Não era tão tarde. Pelo menos pra mim não parecia, mas já estava de noite, sem estrelas. E o que menos importa é aonde eu estava.
Eu sei que ela não desvia os olhos do croche, e sua pele parecia se misturar com o céu escuro, sem estrelas.
Morena, com cabelos negros alisados caiam pesadamente sobre as costas, em uma trança desajeitada porém combinava perfeitamente com ela, e com a situação. Vestido amarelo, florido. Lindo. Como ela. Ou como a noite. Flores vermelhas espalhavam-se até metade da coxa, nos seios e ombros. A boca era grossa, e franzia-se de quando em quando, como se sentisse algo, mas escondia nos gestos rápidos da mão, na correria paratentar dar um jeito, encontrar uma solução para toda aquela lã branca.
Ela não parecia real, parecia muito mais uma caricatura do que uma mulher de verdade. O jeito como cruzava as pernas, como fazia o movimento continuo com a agulha, e o melhor é que ela não precisava pensar. Apenas fazia o que tinha de ser feito.
Tinha uma tatuagem no pé direito, uma borboleta vermelha. Não era grande, não era exagerado. Era só perfeito, e encaixava-se em todo o cenário, que parecia ter saído diretamente de sonhos infantis.
Não vi a cor de seus olhos. Poderiam ser verdes, não sei... Alguma coisa me dizia que eram.
Homens passavam, faziam referencias, murmuravam gracejos, e iam embora olhando pra trás, para a morena. Um bêbado murmurava palavras desconexas, não para ela, mas para ele mesmo. Uma criança chorava aos berros altíssimo, perturbador. Mas ela não se movia, parecia perfeitamente em paz consigo mesma.

domingo, 19 de agosto de 2012

Movimentos Simulados

- Bom dia.
- Olá.
- Dia bonito não?
- Como bonito ? chove, faz frio.
- Gosto mais de dias assim. São mais sinceros.
- Não acho.
- Ora, eu acho.
- Babaca.
-  Não gosta de lembranças? Dias assim são bons para lembrar.
- De que?
- De tudo.
- Lembro do meu gato, ou dos homens tirando um samba na tarde de domingo no parque da luz...
- Homens ?
- Um negro, camisa de lim cor de abóbora. Dizia que no nordeste era melhor, o samba...
- Entendo.
- Acha que é melhor?
- O que?
- O samba.
- Não.
- Ora, não seja tolo...
- Ás vezes nem tanto.
- Cale-se, ou mudemos de assunto.
- Desculpe.
- Porque?
- Nada, só para desculpar.
- Desculpo.
- Muito bem.
- Ora, sua mão estava fria.
- Faz parte.
- De que?
- Do fluxo das coisas.
- Desculpe-me, não entendi.
- As coisas vivem, depois esfriam, então se vão.
- O senhor se vai?
- Daqui a pouco.
- Que horas são?
- Não importa mais.
- Aonde vai?
- Aonde preciso ir.
- Pode me dizer?
-  Não tem graça se eu dizer... Uma hora voce irá tambem.
- Irei?
- Sabe, eu já senti falta de conversar com você.
- Não te conheço, não sei nada sobre você, e nem você sobre mim. Não pode sentir falta, de uma coisa que nunca foi sua.
- Eu senti e sinto.
- Ora...
- Surpresa?
- Com o que?
- Como a vida te surpreendeu...
- Isso, eu e voce, não é nada além de banal.
- Mas sei que voce vai lembrar.
- Não acho que vá.
- Olhe, ja está tarde.
- Já vai?
- Não, ainda não escureceu.
- Estranho...
- Concordo.
- Quer um cigarro ?
- Voce não deveria fumar.
- Fumo, porque não a o que ser feito.
- Fumar não apagara lembranças.
- Não fale de lembranças.
- Tudo bem, fume.
-Quem me faz mal são as pessoas, cigarros são consolos.
- Vida dificil...
- Impossivel.
- Por isso está aqui fumando uns cigarros, converssando com alguem que nunca viu, as 5 horas da tarde de uma quarta feira. O que te trouxe a isso?
- Não sei.
- Não é o que parece.
- Parece que sim . Voce é bom pra mim.
- Isso não significa nada.
- Tem razão.
- Tola.
- O que faria se soubesse que tem um minuto de vida?
- Já não resta muito tempo.
- O que disse?
- Voce ouviu, não se faça de tola.
- Bem, o que fara então?
- O mesmo que estou fazendo agora. Não me parece, que há possibilidade mais satisfatoria de fazer algo, que não seja exatamente aqui, nesse banco, vendo voce fumar. Nada, ao meu ver, é mais pleno que isso.
- Não diga bobagens.
- Nunca digo bobagens.
- Ta frio... Olhe as crianças.
- O que tem ?
- Elas brincam. Faz tempo que eu não brinco.
- Faz parte, voce cresceu.
- Não me parece muito bom isso.
- Não é.
- Mas eu encaro bem.
- Estou vendo.
- Sarcasmo?
- Talvez.
- Voce deve ir embora.
- Talvez eu devesse.
- Então vá.
- Promete?
- O que ?
- Que não ira esquecer?
- De voce?
- De suas lembranças.
- Voce não faz parte delas.
- Tanto faz, lembre-se nos dias frios, principalmente.
- Não me resta muito tempo também...
- A nenhum de nós resta.
- Voce não faz ideia...
- Não.
- Pare.
- De que ?
- De concordar.
- Não concordo. Mas eu sei que as coisas são como tem que ser.
- Voce nunca diz nada com nada.
- Tem razão.
- Irritante, vá embora.
- Adeus.
- Não.
- Preciso.
- Eu prometo.
- Ira se lembrar ?
- Sim para o resto da minha vida.